quarta-feira, 23 de maio de 2007

Materia publicada na revista Nova Escola de agosto de 2006

Avaliação - Observação e Registro

Melhor que boletim
Análise descritiva é o melhor jeito de avaliar na creche e na pré-escola. Veja aqui como professoras de São José dos Campos e São Paulo estão fazendo isso



Roberta Bencini

No final do ano passado, a mãe de Ivan Correia, 6 anos, teve uma surpresa. A avaliação do filho não veio endereçada a ela, como de costume, mas ao próprio menino, pela professora Glória Maria Ribeiro dos Reis, da EMEI Maria Alice Pasquarelli, em São José dos Campos (SP). Cada conquista dele em Matemática, em Leitura e Escrita, em Artes e no relacionamento com os colegas consta da carta. Iniciativas desse tipo ainda são raras na Educação Infantil. O mais comum é a avaliação numa tabela, com conceitos e conteúdos do período. O desenvolvimento da criança é classificado como excelente, muito bom, razoável e precisa melhorar. O boletim é acompanhado de frases do tipo: Carlos é bonzinho, Maria é muito esperta, Antônio está bastante avançado...
“Comparações entre as crianças e turmas e boletins em forma de fichas feitos apenas no final do trimestre são superficiais e não ajudam a melhorar a aprendizagem”, diz Zilma Ramos de Oliveira, professora de Psicologia do Desenvolvimento da Universidade de São Paulo. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a avaliação deve incluir o acompanhamento e o registro do dia-a-dia em sala de aula. Portanto, todas as crianças têm direito a uma análise profunda, crítica e reflexiva sobre seus avanços cognitivos, motores, afetivos e sociais. E isso inclui o respeito ao ritmo e às particularidades de cada uma.
Algumas escolas anexam ao texto descritivo fotografias, fitas de vídeo e portfólios. Seja qual for o produto final, o resultado depende de uma rede que começa com o projeto pedagógico da escola, passa pelo plano, anual ou semestral, até chegar ao planejamento do professor. “A avaliação é um dos momentos mais importantes do trabalho docente. Nela ficam evidentes as concepções educacionais da escola”, afirma Zilma.
Ao escrever sobre Ivan, Glória não o comparou a nenhum de seus colegas. A observação do desempenho do garoto tinha como objetivo ajudá-lo a se adaptar ao ambiente escolar e a evoluir. Notas e conceitos não demonstrariam o momento em que ele estava no processo de aquisição do conhecimento. Boletins e fichas atendem apenas às necessidades da escola e muitas vezes se baseiam em uma atividade específica.
Para analisar um ser humano, é preciso conhecer sua história e suas preferências, dificuldades e conquistas. A observação é a chave do sucesso de uma avaliação, e o olhar deve ser atento e apurado. Fácil? Nem um pouco. Dar conta de uma média de mais de 20 crianças por classe exige organização, síntese, análise e, muitas vezes, anotações no próprio momento.
Como fazer o registro
O bom e velho caderno é o melhor companheiro na hora de reunir informações. Nele, cada criança da sala de Glória tem uma página. Durante as atividades, ela só consegue anotar palavras soltas. No final da aula, as idéias são retomadas e as informações organizadas. Para o balanço diário, ela reserva cerca de 30 minutos. Tudo é discutido com a coordenadora semanalmente. Quando surgem dúvidas, Glória recorre aos colegas. O assunto é de todos: coordenadores, direção, equipe de apoio e pais.
Quem não faz registros sistemáticos tem dificuldade na hora de entregar relatórios para a direção e corre o risco de fazer análises incorretas. “Os maiores desafios são organizar as idéias e escolher as melhores palavras”, afirma Helena Cristina Cruz Ruiz, orientadora pedagógica da escola Maria Alice Pasquarelli. A solução? Escrever. Um acompanhamento contínuo é feito com registros individuais, do grupo e dos projetos.
Apesar de difícil no início, a atividade se torna prazerosa. Toda vez que retoma os registros, Glória se lembra dos rostinhos em diversas situações e se emociona. Suas cartas não são longas, mas são cheias de informações e de carinho (leia um trecho na página ao lado).
No CEI Jardim Rodolfo Pirani, em São Paulo, além do caderno, são usadas câmera fotográfica e filmadora – os pais assinam documento autorizando. “Fotos e vídeos ajudam no acompanhamento e na análise da evolução dos pequenos, mas precisam ter foco. Caso contrário, a escola acumula material sem valia”, afirma a coordenadora pedagógica Maria Cristina dos Santos. Por meio das imagens – que são selecionadas e entregues aos pais em um CD no final de cada ano letivo – , ficam documentados o fim do uso das fraldas e a conquista da autonomia de meninos e meninas na hora do lanche. Dica: todas as imagens devem ser datadas e acompanhadas de um comentário. Se não há o que falar é porque elas são desnecessárias.
A verdadeira avaliação é uma via de duas mãos. Ao mesmo tempo que observa o crescimento da criança, você revê seus métodos, estratégias e intervenções (leia o quadro ao lado). As imagens de vídeo feitas pela coordenação da Rodolfo Pirani são vistas pelos professores em reuniões mensais. As melhores práticas de sala de aula são discutidas e apresentadas ao grupo. Os conflitos e os problemas também são colocados em pauta. “O objetivo não é expor ninguém, apenas provocar reflexões e respostas às principais dúvidas dos professores”, diz Maria Cristina. Ao observar, o professor registra; ao registrar, reflete; ao refletir, planeja; ao planejar, avalia; e ao avaliar, replaneja. A avaliação para ser eficiente deve fazer parte dessa corrente.
Avaliação em forma de texto...
• Possibilita à criança e à família compreender os avanços no período.
• Facilita o planejamento de atividades específicas para as necessidades de cada um.
Os nove passos da avaliação
1. Planejar
2. Observar com olhar apurado
3. Investigar os processos de aprendizagem
4. Registrar e organizar as observações
5. Analisar os resultados
6. Comparar tarefas e atividades
7. Recortar os fatos mais relevantes
8. Comunicar a análise9. Replanejar
Quer saber mais?
Contatos
• CEI Jardim Rodolfo Pirani, R. Cinira Polônio, 20, 08395-320, São Paulo, SP, tel. (11) 6753-5309
• EMEI Maria Alice Pasquarelli, Praça Joaquim Figueira de Andrade, 60, 12221-220, São José dos Campos, SP, tel. (12) 3929-1854
Bibliografia
• Educação Infantil: Muitos Olhares, Zilma Ramos de Oliveira, 190 págs., Ed. Cortez, 25 reais • Manual de Portfólio, Elizabeth Shores e Cathy Grace, 160 págs., Ed. Artmed, tel. (51) 3027-7000, 44 reais